segunda-feira, 20 de agosto de 2012


Até logo, Vô Dominguinho
            A vida é um fenômeno que reserva para si um misto de deslumbramento e ao mesmo tempo de medo do que a sombra do futuro nos reserva ao longo do seu caminho. Fenômeno ainda mais raro é a vida de um ser que viveu uma vida tão plena, plena no carinho, plena no auxílio ao próximo, plena na retidão de caráter. Plenitude que não só transmitiu como irradiou em um amor de uma pureza paterna tão leve, desprovida de egoísmo que mesmo na altura final da sua vida não poupou elogios as enfermeiras que o auxiliava no leito.                                                                 Despedi do meu avô com o prazer de fechar os olhos e não recordar de uma mínima lembrança negativa. Memórias de uma meninice repletas de abraços ao acordar nas manhãs de férias e dar o primeiro abraço do dia no vô. Memórias da minha fase difícil que encontrei em sua casa o alento para seguir em frente e não só conseguir fazer as pazes comigo mesmo, mas compreender que o amor que ele tinha com a sua mamãe deveria ser o amor que eu deveria ter com a minha. Fui ainda mais feliz ao ter certeza que teria sempre a Vó, Tia Nerinha e a Tia como os tutores da minha jornada. Na fase adulta o carinho talvez tenha mudado um pouco seus pólos e percebi que era eu que deveria cultivar um carinho com certa necessidade de cautela e proteção por ele, e o amei mais.
            Na ultima fase da sua vida pude presenciar a lida na padaria e ter a certeza que momentos tristes ou depressivos não faziam parte da sua rotina, tive o prazer de entregar com ele as balas para as sempre meninas bonitas da cidade, mesmo que já não tão moças ou meninas em idade. Talvez, o único vício que meu avô teve nessa vida foi ao trabalho, mas não foi um ofício que minava suas forças, ao contrário, não tirava de lá somente as bases de seu sustento físico, mas da sua presença humana, do humor sereno e da mente tranqüila. Um exemplo de um humano que chega a velhice e mostra que dignidade quando é conquistada passa ser uma instituição social de um valor tão revigorante e necessário que passa a ser um direito.
            Não quero ao escrever esse texto passar uma idealização da figura do meu avô, e muito ao menos mostrar o tanto que nossa grama era mais verde do que a do vizinho, mas não posso negar que minha meta como ser humano nunca foi algo distante do que meu avô foi em vida. Nossa família sempre teve, tem e terá os mesmo problemas que a dos outros, mas a figura central que acalma os ânimos e desperta o altruísmo em nossas mentes sempre foi ele e por ele.
            Para os momentos tristes eu guardo seu sorriso e amor incondicional a vida como o maior acalento. Sei que não será fácil, mas se tenho uma dívida em vida com ele é a necessidade de manter o sorriso no rosto e a tranqüilidade no peito. Nessa vida superficial, descartávelmente capitalista meu avô não foi ninguém, mas guardo a certeza que não houve ninguém como meu avô.
                                                                                                    João Antônio Nicoli Tavare