Nada mais tocante que uma paixão, a
chama que, como disse o poeta, arde sem doer. Mas a paixão pela paixão é algo
construtivo? A obsessão de um parnasiano pela métrica de uma ânfora grega ou de
um compositor pela harmonia sonora de um soneto tem a mesma raiz da obsessão de
um ardiloso serial killer que mata pela simples razão da morte. Até mesmo um
Van Gogh capaz de pintar o brilho de um céu estrelado é capaz de arrancar sua
própria orelha em busca do perfeito imperfeito.
Antes de mais nada sou um obsessivo,
maníaco pela perfeição que eu mesmo criei. Uma perfeição sem razão de ser, mas
que me torna o imperfeito a luz de um raio sem saída. Talvez, ou com certeza,
sou um obsessivo menor no talento, mas tão grande na dor. Sou incapaz de dormir
sem o barulho de um ventilador, sem que todas as portas do armário estejam
fechadas. As partes que gostava de um livro eu as decorava, no ensino médio não
me permitia estudar menos que dez horas em casa. Quando fiz regime perdi metade
de minha massa corpórea, quando cansei do ato, voltei a engordar o dobro. Ter
uma meta e ser refém da mesma, são grandezas diametricamente opostas.
Por muito
me senti um prisioneiro de mim mesmo, sem a capacidade de não realizar o que me
propunha. O medo de não conseguir era tão grande que curvava aos meus próprios desejos.
O martelo que martela até o prego e a madeira serem só uma substância, fundidas
no desejo de tornar a simetria não uma busca espiritual, mas uma meta terrena.
Leio durante dois dias sem parar,
estudo até dormir sentado e ao mesmo tempo que sou o comediante me transformo
no maior Scrooge da terra. Adoro o Natal, mas fico atacado no dia. Todo
obsessivo é aquele que procura a mesma razão da vida na teoria que criou para si,
mesmo que tal seja intangível. É claro que não haveria um Tchaikovski, Mozart,
kant ou pelo menos, uma explicação para eles, sem o diagnóstico da
bipolaridade.
Qual o preço que tais figuras
pagaram pelo mérito? Garanto que a perfeição pela forma não frutificou em uma
vida plena, tanto no contato, como em uma estabilidade essencial a vida
coletiva. Cito exemplos de gênio, uma vez que a obsessão só se faz presente e
bonita pela eloquência, grandiosidade e beleza, mas se cala aos milhões de
comuns que vivem refém de algo que criaram. Acredito que a quinta sinfonia não
só deveria ser criada, mas também ter sido experimentada pelo seu criador.
Bethovem, provavelmente, nunca sentiu o prazer da sua obra de arte, devido ao
fato de sua obsessão nunca permiti-lo achar digno uma criação que não seja tão grandiosa
quanto seu pensamento obsessivo. Ser obsessivo é ser o próprio algoz que fere
si próprio até que o objeto do desejo se torne presente. O amor não pode ser
uma obsessão e quem ama demais, no fim não ama a si mesmo.
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