Há pequenas lições familiares que
persistem no decorrer dos anos e que aos poucos vão se sedimentado e assumindo
feições variadas ao longo da nossa existência individual. Uma dessas lições
aprendi com minha mãe e que nunca abandonei
é o fato de acreditar que conhecemos realmente uma pessoa ao analisar seus
pequenos atos e comportamentos cotidianos e concluir que se não há bondade pelo
menos se há honestidade moral por detrás.
Tudo aparentava ser um final de
tarde típico de uma quarta-feira entediante pela aula conceitualmente nebulosa
de Estatística até que a teoria materna se mesclasse com a realidade na forma
de madona! Ao chegar à Cultura Inglesa
percebo a ausência do meu iPhone e entro em desespero, sabia que não só havia
ficado dentro do ônibus, mas que, provavelmente, não o veria mais. Ligo para o
numero do celular já sem esperança de que haveria resposta quando uma voz de
uma moça gentil atende e diz que está tudo bem, que estaria em certo local tal
hora e não haveria problema em devolver o aparelho.
Esse fato desassociado de contexto
parece ser uma banalidade recorrente e que estaria eu a escrever tal relato por
mera casualidade ou elucubração estéril, mas acho que não se trata disso. Não
tenho dúvida que honestidade e compromisso com o próximo seja algo que não deva
ser visto como qualidade, mas como peça fundamental para se viver em
coletividade. Mas convido ao leitor a pensar se tal fato é uma característica de
nossos tempos. Por se rara tal atitude se torna cara ao público, e tudo que há
em ausência se torna valioso pela essência. Não elogiar a atitude da moça não
seria a aceitação de que seu ato é mero formalismo social e não necessita de
ressalva, mas o colocar na esfera de experiências individuais que se perdem e
não se reproduzem em sua essência. Tornando um fato menor em situações em que o
exemplo é louvável.
Ao entregar meu celular a Carol me
diz que não deveria lhe fazer tantos elogios, pois seu ato não era se quer uma
opção. Era a única ação esperada de uma pessoa que encontra um aparelho tão
caro largado no ônibus e que teria certeza que eu agiria da mesma maneira se os papéis
estivessem trocados. Encerro o texto agradecendo tal “Estranha” por ter me mostrada
uma faceta que às vezes se mostra tão escassa e incomum em nossa selva de pedra
urbana que apaga o homem e o torna um ser desfocado em meio à multidão.
Agradecer a minha “Estranha” favorita é agradecer a mim mesmo, pois obtive a
certeza que a honestidade compensa e que há um humano por trás da mascara do
sujeito apagado pela massa urbana.
Acredito que a Carol nunca chegará a
realmente ler esse texto, mas que os demais estranhos ao deparar com tal
escrita se vejam tão nobres como a minha “Estranha” favorita e que no meio de “Estranhos”
sempre há o SER HUMANO capaz de exercer seu aspecto moral.
O perfeito valor consiste em fazer, sem testemunhas,
o que se faria diante de todos.
François de La Rochefocauld
Nenhum comentário:
Postar um comentário